Crianças e jovens transgêneros: a importância da medicina baseada em evidências científicas

Toda vez que alguém alegar que uma criança não deve ter sua identidade transgênera reconhecida é preciso listar os INÚMEROS estudos científicos recentes que mostram os BENEFÍCIOS INEQUÍVOCOS da transição de gênero e das abordagens afirmativas para crianças e adolescentes ASSIM COMO os MALEFÍCIOS INEQUÍVOCOS da proibição da transição. Abordagens AFIRMATIVAS partem do princípio que uma criança ou adolescente deve poder explorar livremente a sua própria identidade de gênero sem medo de sofrer rejeição ou represália.

OU SEJA: é simplesmente uma FALÁCIA alegar que o reconhecimento de uma identidade trans seja uma IMPOSIÇÃO VIOLENTA de uma identidade para uma criança ou jovem. Se você luta para que “crianças sejam crianças” e para que elas sejam “livres” você deve NECESSARIAMENTE LUTAR para que a cisgeneridade não seja A ÚNICA OPÇÃO para crianças e jovens! Simples assim. É a cisgeneridade que é hegemonicamente imposta e pressuposta como única forma possível de expressão de gênero para crianças e adolescente. Estamos falando sobre evidências científicas, e não achismos.

A identidade transgênera de um jovem NÃO “reforça” mais estereótipos de gênero do que uma identidade cisgênera. Se assumimos que um menino ou menina cis têm maturidade e legitimidade suficientes para se identificarem como menino e menina, respectivamente, temos que concluir na mesma proporção que um menino ou menina trans têm a mesma maturidade e legitimidade para se identificarem como menino e menina, respectivamente. Se assumimos que a identificação de gênero de um menino cis é autêntica e legítima, temos que reconhecer a mesma autenticidade e legitimidade da identidade de um menino trans.

Segundo Gülgöz et al. (2019) “as crianças transgêneras mostraram um padrão claro de desenvolvimento de gênero associado ao seu gênero atual e não ao seu sexo atribuído no nascimento”. De acordo com o estudo, o senso da identidade de gênero de crianças trans é TÃO FORTE QUANTO o de crianças cis, independentemente de o fato das crianças terem transicionado recentemente ou não. Segundo os autores, o desenvolvimento da identidade de gênero de crianças transgêneras antes da transição social não diferiu significativamente daquele de um grupo de crianças transgêneras de mesma idade testado após a transição social. Isto nos permite simplesmente dizer, como formula Sanders, para o portal them.: acredite nas crianças trans.

Fonte: https://www.pnas.org/content/116/49/24480

Crianças trans se beneficiam enormemente com a permissão para a transição social. O estudo de Durwood et al. (2017) mostra que permitir que crianças trans façam a transição virtualmente elimina taxas mais altas de depressão e baixa autoestima. Os autores concluíram que, enquanto crianças e jovens que não tiveram a permissão para transicionar têm níveis muito mais altos de depressão e ansiedade, aqueles jovens e crianças que tiveram a liberdade e oportunidade de transacionar (e efetivamente transicionaram) não diferiram do grupo de controle e dos pares cisgêneros quanto a sintomas de agravo na saúde mental, como depressão e baixa autoestima.

Fonte: http://www.jaacap.com/…/S0890-8567%2816%2931941-4/fulltext

Jack Turban (2017), do Child Study Center em New Haven, Connecticut, autor do editorial que acompanhou o estudo, ainda acrescenta que quando as crianças não têm permissão para fazer a transição, isso pode prejudicar seus relacionamentos com seus pais e terapeutas, “porque essas crianças se sentem julgadas por serem transgêneras”. Esse conflito interno percebido e a sensação de estigma “podem ser perigosos e podem levar aos altos índices de ansiedade, depressão e até mesmo suicídio que vemos nessas crianças”.

Leia também: https://archive.thinkprogress.org/trans-kids-socially…/

https://www.them.us/…/study-trans-cisgender-children…

Referências:

DURWOOD, Lily; MCLAUGHLIN, Katie A.; OLSON, Kristina R. Mental health and self-worth in socially transitioned transgender youth. Journal of the American Academy of Child & Adolescent Psychiatry, v. 56, n. 2, p. 116-123. e2, 2017.

GÜLGÖZ, Selin et al. Similarity in transgender and cisgender children’s gender development. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 116, n. 49, p. 24480-24485, 2019.

TURBAN, Jack L. Transgender Youth: The Building Evidence Base for Early Social Transition. Journal of the American Academy of Child and Adolescent Psychiatry, v. 56, n. 2, p. 101, 2017.

Imagem: Conner Baker (unsplash).

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Ainda sobre crianças e adolescentes trans: o reconhecimento da identidade de gênero de crianças e adolescentes trans NÃO depende de um diagnóstico baseado em estereótipos de gênero. As perspectivas transfeministas são CONTRA a figura do diagnóstico médico/psiquiátrico para o reconhecimento da autenticidade e legitimidade das identidades trans. Não faz sentido dizer que o reconhecimento da identidade de gênero em crianças dependa de uma imposição EXTERNA (como uma rotulagem) de uma identidade trans com base nas preferências das crianças por certas brincadeiras, por exemplo.

Algumas pessoas dizem que a única forma com que falamos sobre crianças e jovens trans é a partir de um olhar externo: vemos que uma criança designada como menino gosta de atividades/brincadeiras tipicamente (ou “estereotipicamente”, odeio aliás esse termo “estereótipo” em todo contexto de discussão sobre questões trans) consideradas como “coisas de menina” e rotulamos essa criança de “menina trans”. Isso é simplesmente FALSO.

Não existe contradição entre reconhecer a legitimidade de uma identificação trans na infância e o reconhecimento que meninos podem gostar de coisas “de meninas” e que meninas possam gostar de coisas “de meninos”. Se lutamos para que crianças não se sintam constrangidas e rejeitadas pela sua expressão de gênero estamos lutando tanto em favor das crianças trans como daquelas com uma expressão não conforme e não são trans! Não deveria ser simples de entender?

Quando falamos sobre o reconhecimento da identidade trans de uma criança não estamos identificando ela com um termo que ela mesma não reivindica. Criança trans é aquela que reivindica uma identidade de gênero que não coincide com a designada ao nascer. Isso não tem a ver com estereótipos, simplesmente porque não depende de estereótipos. Uma menina trans frequentemente vai gostar de atividades/brincadeiras consideradas masculinas e um menino trans frequentemente vai gostar de atividades/brincadeiras consideradas femininas. O fato de uma menina trans gostar de coisas “masculinas” não a faz “menos” menina trans, assim como não faz da menina cis um menino, “menos” menina ou uma “não”-menina.

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“Ah como os pais podem ter certeza que uma criança de 5 anos é trans? A identidade trans da criança pode ser uma ideia vinda/imposta dos/pelos pais”.

Vamos ao jogo dos dois pesos e duas medidas. Como os pais podem saber que aquela criança que foi designada com o sexo masculino ao nascimento é um menino? Não seria um viés acreditar que o sexo assignado ao nascimento possa prever o gênero das crianças? Engraçado que ninguém diz que a expectativa de que uma criança designada com o sexo masculino ao nascer seja um menino é uma “ideia vinda dos pais” – quando precisamente é disso que se trata. A ideia que nós mulheres trans sempre fomos “meninos” durante nossas infâncias, essa expectativa que finge ser uma mera descrição de fatos e que nós rejeitamos – essa ideia que impôs a masculinidade – é uma ideia imposta socialmente e coercivamente, inclusive pela família; uma ideia que estipula a cisgeneridade como norma, padrão.

A ideia de que a identidade de gênero “verdadeira” de uma criança coincide naturalmente com o gênero assignado ao nascimento deveria ser questionada aqui – se vocês realmente estão interessados sobre como os pais criam expectativas externas sobre a identidade de gênero de seus filhos.

Ninguém precisa ter “certeza” sobre a identidade de gênero de uma criança para reconhecer que crianças deveriam ter o direito de se identificarem com o gênero que preferem sem sofrer represália. A única certeza que alguém tem é que crianças tem melhores resultados em saúde mental quando seus pais aceitam que elas possam explorar a própria identidade de gênero para além da cisgeneridade. Permitir que uma criança se identifique como trans e faça a transição não é impor uma identidade trans; o que é imposto é a congruência com o gênero designado ao nascimento. É contra ESSA imposição que vocês têm que lutar contra! Acordem!

Uma criança que teve a OPORTUNIDADE de realizar a transição terá a mesma liberdade de se identificar ou voltar a se identificar com o gênero que foi originalmente designado ao nascimento. Por outro lado, a crença de que a identidade de gênero de uma criança coincide espontaneamente com o gênero assignado é na verdade uma imposição violenta que alimenta proibições e violências absolutamente injustificáveis durante a infância de crianças trans.

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A imagem pode conter: texto que diz "Non-binary kids exist. Trans girls are girls. Trans boys are boys. If you believe cis kids when they tell you who they are, but hold gender diverse youth to a higher standard, you are the problem."

Crianças não-binárias existem. Meninas trans são meninas. Meninos trans são meninos. Se você acredita em crianças cis (gênero) quando elas te dizem quem elas são, mas mantém os jovens de gênero divero em um padrão mais elevado, você faz parte do problema. Via Gender Inclusive Schools.


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