Quando vemos radfem negando o reconhecimento da legitimidade das identidades trans vemos a defesa do discurso que entende que experiências entre sujeitos marcados como homens são essencialmente diferentes daqueles sujeitos marcados como mulheres. Há a tentativa de dizer que mulher é mulher e homem é homem, que socialização não falha, que nenhum homem sabe o que é ser um mulher de verdade, que existem supostas diferenças biológicas que determinam experiências incomensuráveis entre os sexos.
E vemos a ministra do Bolsonaro, Damares Alves, em uma matéria do Globo, defendendo que mulheres são diferentes de homens e que essa suposta diferença deva ser “ensinada” nas escolas, que meninos devem dar flores para meninas, para que todos aprendam que meninas são frágeis e meninos devem ser cavalheiros, que meninas por serem delicadas “não podem levar porrada” – o que pressupõe que meninos possam. Pois é, a futura sei lá o que ministra de Bolsonaro simplesmente pressupôs que meninos possam “levar porrada” nas escolas.
Vejam ainda o que ela diz: “mulheres são frágeis mas são especiais, fazemos coisas que eles não conseguem”. Caindo aqui no essencialismo biológico, como se funções biológicas e reprodutivas estivessem necessariamente e estritamente atreladas a questões de gênero, e os aspectos de cuidado, à feminilidade. Como se homens não pudessem criar filhos, não serem femininos ou expressarem afetividade, por exemplo. E mulheres que não querem ser mães, que simplesmente rejeitam esse suposto destino? E homens trans que engravidam… nem precisaria mencionar aqui.
Quando se nega o reconhecimento das identidades trans não se está propondo nenhum tipo de questionamento radical aos estereótipos de gênero. Ao contrário, estamos caindo no mesmo discurso da pastora evangélica que diz que o destino da mulher é ser mãe, que a sociedade ideal seria aquela em que mulheres não trabalham e que menino vira menino com porrada. Quando se defende que os limites que separam o que se considera masculino e feminino e as experiências que se relacionam aos gêneros sejam intransponíveis estamos caindo no reacionarismo. Não é radical e muito menos um posicionamento feminista.