Texto de Léo Barbosa.
Deixa eu tentar colocar de outra forma o que para nós, pessoas trans e travestis já é fato.
Nós já estamos em um estado de exceção desde sempre!
Para termos direito a um nome que nos seja adequado, temos que provar que somos doentes mentais e com laudos entrar com ação no judiciário para depois ainda rezar para que o juiz não seja transfóbico e nos negue esse direito básico.
Para irmos a escola e não sofrermos as mais perversas discriminações, podendo vir a chegar a mortes, temos que implorar para que nos chame em nosso nome social e muitas vezes, segurar o xixi e o coco, para não sermos espancados/as ou estuprados/as nos banheiros. O que já aconteceu muitas vezes com pessoas trans e travestis que tem a coragem de continuar nas escolas. E quanto a nossa dignidade, quem nos protege? Quanto a nossa integridade física, quem nos protege? Quanto ao nosso direito a escola, quem nos garante?
Em casa temos que lidar com os pais, quando esses não nos expulsam, que nos desrespeita, não nos aceita e muitas das vezes nos espancam por não aceitar que seu filho seja um “traveco”, ou sua filha seja “a porra de uma sapatona”, pois nem pensar aceitar nossa identidade de gênero. O que pode piorar se os pais forem evangélicos de igrejas fundamentalistas. Ai, querido, é uma surra por dia ou mais, e expulsão de casa é recorrente. Fora os exorcismos. E quanto a nossa dignidade, quem nos protege? Quanto a nossa integridade física, quem nos protege? Onde está o ECA para nós?
Nas situações de emprego… tenho o que escrever? Vamos lá… O mercado não absorve travestis, mulheres transexuais e homens trans. O direito ao nome social e lei que proteja só em São Paulo, e mesmo assim, como vai provar que ele não aceitou vc por ser trans? Tem que ser uma discriminação muito declarada pra ter embasamento pra entrar com a lei. Mas vamos descrever mais, vou deixar meu caso: tenho 45 anos, sou formado em administração de empresas desde 2002, e estou sem registro formal desde 1989, quer mais ou precisa que eu desenhe?
Eu posso ficar aqui elencando cada exclusão que nós temos, mas é mais interessante propor a vc que vc pense em situações, e vc mesmx, responda; “E se fosse uma pessoa trans ou uma travesti aqui nessa situação, como ele/a seria recebido/tratado/a?”
Somos todos iguais, mas se vc não souber que direito formal, ou seja, o que está escrito lá na lei é diferente de direito material; a verdade de como a lei trata a cada um. Ou seja, o direito material ainda precisa ser alcançado. Se vc não sabe sobre isso, continua com essa ideia rasa de que somos todos iguais, pq não somos.
Precisamos atentar as especificidades de cada um e nelas chegarmos a igualdade que preconiza a C.F. .
“Tratar os iguais com igualdade e os desiguais na medida de suas desigualdades.”, já dizia. Boaventura Souza Santos.
Se vai piorar pra geral, eu não sei. Mas nós já vivemos em um Estado de exceção, se é pra piorar pra nós é só autorizar em lei a nossa morte, já que somos o país que mais mata travestis, mulheres transexuais e homens trans no planeta, basta liberar de responsabilidade o nosso extermínio.
Léo Barbosa é graduando em ciências jurídicas, Coordenador do setorial do Grande ABC pelo IBRAT, Militante da causa de pessoas trans e travestis e Militante de Direitos Humanos.