O “Império Transexual” que nunca existiu

Texto de Leonarda Lisboa.

Para Janice Raymond, feminista radical que escreveu o livro ‘Transsexual Empire – The Making of the She-Male’, a comunidade médica patriarcal reforçaria opressões de gênero através de intervenções cirúrgicas – as cirurgias de “mudança de sexo”.

Urologia, ginecologia, endocrinologia, psiquiatria, psicologia… estariam trabalhando tendo como interesse perpetuar estereótipos de gênero ao fazer parecer que pessoas trans existiam* como patologia e que precisariam de intervenções em seus corpos, assim como o envolvimento de legisladores que apoiassem a alteração de documentos, registros e a própria lei.

Ou seja, a própria comunidade médica, com sua ‘soberania’, estaria por trás do ‘Império Transexual’ para manter os interesses do patriarcado e as normas de gênero.

A solução de Raymond para a transexualidade seria “moralmente apagá-la da existência”, impedindo a mudança nas leis, intervenções cirúrgicas, e confrontando a opressão de gênero através da educação e conscientização.

Raymond não levou em conta que naquela época, e ainda hoje, existem poucos e raros médicos que trabalham voltados para a saúde de pessoas trans, os que sabem performar algumas cirurgias são ainda em menor número; que inclusive na época estes eram hostilizados e marginalizados na comunidade médica; que a indústria farmacêutica até hoje não desenvolveu medicamentos e hormônios voltados para o uso de pessoas trans… o que nos faz crer que este ‘Império Transexual’ não era e continua não sendo muito amigável com pessoas trans.

Quase 40 anos após a publicação do livro e transexualidade continua sendo algo não aceitado na nossa sociedade, e ao contrário do que Raymond dizia, não é endossada pelo patriarcado, se o fosse, os processos legais e médicos envolvendo pessoas trans não seriam de tão difícil acesso, as pessoas trans não seriam um dos grupos sociais com maior taxa de assassinatos e suicídios, além poucas chances de emprego e baixo nível de educação.

Ou o Imperio Transexual não existe ou ele é a “arma do patriarcado” mais fraca que já existiu.

*para Raymond pessoas trans seriam apenas pessoas inconformadas e infelizes com os papéis de gênero estabelecidos socialmente.


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