O afeto como que nos afeta.

Por Hísis Rangel

Nesses últimos dias eu tenho pensado muito sobre afeto/afetividade com nós mulheres trans e travestis (Não que eu não pense sempre, mas se intensificou muito nessas últimas semanas). Leio algumas paradas, escuto algumas amigas, converso sobre. E talvez eu já tenha falado isso aqui, mas ainda acho que a escrita possa ser a forma mais libertadora de colocar meus sentimentos pra fora.

Eu sempre me questiono por que os homens não estão assumindo as mulheres trans e travestis, não estão as amando em público. Cheguei a questionar se era eu, Hísis, que não era digna de ser amada. Cheguei a questionar que talvez eu não tivesse esse reconhecimento do afeto pela minha não passabilidade cis. E eu acho que isso não tem nada haver, são fatores influenciadores, mas apenas um grão em toda a extensão de areia.

As vezes eu gosto de pensar que nós mulheres trans e travestis, não somos só nós, as vítimas desse sistema, pq a sociedade tb impõe que um homem não apareça com um “traveco” se não ele perderá todo seu “crédito de homem”. Creio que seja algo muito mais estrutural. Percebo que nem homens cis e nem homens trans estão amando essas mulheres, e pra gente resta a sombra, a casa abandonada ou o terreno baldio, pq não podemos ser vistas entrando na casa de fulano.

E vivemos de migalhas de afetos, muitas das vezes de caras que acabam vendo em nós essa carência afetiva e acabam se aproveitando dela, que muitas vezes veem que somos tão sozinhas e que com qualquer falso sorriso, nós já abrimos a nossa vida. E com o sorriso falso, nos escutam, fingem entender a nossa dor, talvez até haja com naturalidade se caso nos leve para algum lugar público, falam tudo o que a gente quer escutar, até gozar. Depois do gozo, vem as desculpas, as enroladas ou até as escapatórias, quando não somem e nem se quer nos dão satisfação. Nos usam como anomalia, pq muito homem sente atração por pau, e talvez nós, sejamos a identidade mais próxima para matar a curiosidade daquele, sem ferir toda a sua masculinidade.

Mesmo tendo mil decepções afetivas e com caras que eu nunca achei que fossem fazer aquilo (pois é gente, eu ainda acredito em homem), eu continuo vivendo a minha vida, esperando um dia deixar de ser Alice para ser Cinderela, ou não mais ser a Geni, que foi condenada a servir, e não a sentir, ou se for pra sentir, que sinta dores.

Hísis Rangel


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